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O tratamento de meduloblastoma na era molecular

4 Junho 2018

Escrito por Francisco H. C. Felix

A nova revisão de 2016 da classificação de tumores cerebrais da Organização Mundial da Saúde (OMS) introduziu, pela primeira vez, a biologia molecular no diagnóstico dos subtipos de meduloblastoma Meduloblastoma (lat medulla = núcleo; gr blasto = primitivo; oma = tumor) é um câncer do cerebelo, de crescimento rápido, mais comum em crianças. É causado por mutações genéticas em genes do grupo WNT/Beta-catenina, na via de sianlização SHH (Sonic hedgehog) ou em outros grupos de genes. Algumas síndromes genéticas raras, como a síndrome de Gorlin e síndrome de Turcot, aumentam o risco de desenvolver meduloblastoma. . Ainda não se sabe, no entanto, como estes novos conhecimentos vão influenciar o tratamento desta doença. Os resultados de um ensaio clínico publicados no The Lancet Oncology trazem as primeiras informações sobre este assunto.

Pesquisadores do Saint Jude Children’s Research Hospital (Memphis, TN, USA) e de diversos outros centros nos EUA e Europa relataram os resultados do ensaio multicêntrico fase 2 SJYC07. Nesse estudo, crianças com meduloblastoma foram classificados em grupos de risco diferentes de acordo com sua biologia molecular e tratados com uma esquema adaptado ao risco.

O estudo incluiu crianças de 0 - 3 anos e aqueles entre 3 - 5 anos que não tivessem fatores de risco elevado. O início do tratamento era obrigatório até no máximo 31 dias após a cirurgia. Os pacientes tinham que estar com um escore de Lansky de pelo menos 30 e nunca ter recebido tratamento anterior. Os pacientes foram divididos em 3 grupos de risco: baixo risco, risco intermediário e alto risco.

A quimioterapia Quimioterapia refere-se ao tratamento de doenças por substâncias químicas que afetam o funcionamento celular. Pode ser quimioterapia antimicrobiana, quimioterapia antiviral, quimioterapia anticâncer, etc. Popularmente, o termo refere-se à quimioterapia anticâncer ou antineoplásica, um dos tratamentos do câncer onde são utilizadas drogas capazes de induzir morte celular. As células de câncer são mais sensíveis à quimioterapia, por se multiplicarem rapidamente. Células normais também podem ser afetadas, ocasionando diversos efeitos colaterais, como a queda de cabelo. inicial (indução) foi igual para todos os grupos (metotrexato, vincristina, cisplatina e ciclofosfamida). Os pacientes de alto risco receberam também vimblastina. A quimioterapia que se seguiu (consolidação) foi diferente para cada grupo de risco. Os pacientes de baixo risco receberam dois ciclos de ciclofosfamida, etoposido e carboplatina com intervalo de 4 semanas. Os pacientes com risco intermediário receberam radioterapia A radioterapia é uma modalidade de tratamento que utiliza uma radiação ionizante (raios X, raios gama, partículas beta, etc) para a terapia de tumores, principalmente os malignos. Baseia-se na destruição das células tumorais pela absorção da energia da radiação, causando morte celular. O princípio básico maximiza o dano no tumor e minimiza o dano em tecidos vizinhos normais, irradiando uma região de várias direções diferentes, o que “focaliza” a radiação na área alvo. no local do tumor. Pacientes com alto risco receberam quimioterapia com topotecan e ciclofosfamida.

Após a consolidação, todos os pacientes receberam um tratamento de manutenção igual, com ciclofosfamida, topotecan e erlotinibe. Foram avaliadas a sobrevida livre de eventos e os fatores moleculares que se associaram com a sobrevida.

Os resultados mostraram uma sobrevida livre de eventos Sobrevida livre de eventos (SLE): em análise de sobrevivência, é o tempo que decorre até que ocorra um determinado evento pré-determinado. Na oncologia, costuma-se padronizar que é o tempo entre o início de um tratamento até a falha desse tratamento. A falha inclui a progressão ou recidiva do tumor ou então o óbito do paciente por qualquer causa. A SLE é muito usada como desfecho substituto em ensaios clínicos. em 5 anos de 31% para todos os 81 pacientes recrutados, sendo de 55% para o grupo de baixo risco, 24% no grupo de risco intermediário e 16% no grupo de alto risco. Entre os grupos moleculares, os pacientes do grupo SHH tiveram 51% de sobrevida, e os grupos 3 e 4 ficaram com 8% e 13% de sobrevida cada. Estes resultados, infelizmente, não acrescentaram nada ao que já se sabe da dificuldade de tratar pacientes com meduloblastoma com menos de 5 anos de idade.

Os autores do estudo concluíram que serão necessários mais pesquisas para definir qual o papel real da nova classificação molecular no tratamento de crianças com meduloblastoma e como esse conhecimento molecular pode ajudar a melhorar os resultados do tratamento.

O que significa isso? Será que o ensaio clínico deu errado? A biologia molecular falhou? Estas são peeguntas inadequadas. O conhecimento médico científico avança através de uma série de passos, alguns experimentos funcionam, outros não. O método científico não serve para garantir resultados positivos. Se já soubéssemos de um resultado de antemão, para que realizar o experimento? O método científico é o que nos dá uma mínima certeza de que um conhecimento é válido. Mas é preciso testar. Testar significa errar às vezes, aprender con os erros e seguir errando menos e acertando mais.

Figura: subgrupos moleculares do meduloblastoma. Quatro grupos são distinguidos: grupo WNT tem mutações do gene CTNBB1 e outros relacionados; grupo SHH tem mutações da via e sinalização SHH; grupos 3 e 4 são distinguidos por um perfil de alterações moleculares. Taylor MD et al. Acta Neuropathol (2012) 123:465-472. CC BY-NC

Esta postagem não representa sugestão de tratamento. Apenas um especialista pode judiciosamente decidir quais informações divulgadas podem modificar de alguma forma um esquema de tratamento, e de que forma.

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