O perigo da dexametasona para pacientes com tumores cerebrais

30 Abril 2018

Escrito por Francisco H. C. Felix

No número 3 do volume 137 do Journal of Neuro-Oncology (JNO), um estudo observacional retrospectivo mostrou que a dexametasona, droga usada rotineiramente para tratar edema cerebral em pacientes com tumores Câncer (lat cancer = caranguejo): grande grupo de doenças muito diferentes entre si, tendo em comum a proliferação celular incessante e desordenada, a capacidade de invadir localmente tecidos saudáveis do organismo e a capacidade de se espalhar para locais distantes (metástases). Os diversos tipos de câncer são teoricamente oriundos de uma única célula (origem clonal) a qual sofreu mutações em seu código genético. Saiba mais aqui. do sistema nervoso central, pode reduzir a sobrevida Análise de sobrevivência ou de sobrevida é um ramo da estatística que analisa a duração de tempo até que um ou mais eventos aconteçam, como morte ou falha de um tratamento. A análise de sobrevivência tenta responder a perguntas como: qual é a proporção de uma população que sobreviverá após um certo tempo? Como circunstâncias particulares aumentam ou diminuem a probabilidade de sobrevivência? Assim, a definição de sobrevida é importante. Na oncologia, em geral fala-se na sobrevida a partir do diagnóstico de uma doença (ou a partir do início de um tratamento). e aumentar a mortalidade dos pacientes.

Uma equipe de pesquisadores alemães da Goethe University em Frankfurt e do German Cancer Research Center em Heidelberg publicaram um artigo com os resultados de um estudo retrospectivo Estudos retrospectivos: ou estudos observacionais, analisam dados de pacientes tratados ou seguidos previamente e anotados em prontuários. Como o estudo é planejado e realizado após o procedimento analisado, não há chance de modificar os parâmetros envolvidos, logo, não se pode controlar fatores que podem alterar ou confundir os resultados. Assim, ao contrário de ensaios clínicos (planejados antes de um procedimento, neste caso chamado de intervenção), os estudos observacionais não podem ser conclusivos, e são considerados exploratórios (geram novos conhecimentos que são usados para criar teorias e planejar ensaios). em pacientes com glioblastoma Glioblastoma (GBM), anteriormente conhecido como glioblastoma multiforme, é o tipo mais comum e agressivo de tumor maligno cerebral que acomete os seres humanos. Em crianças e adolescentes, o GBM é incomum, e os tumores cerebrais malignos mais frequentes são meduloblastomas. Além disso, a biologia molecular dos GBM pediátricos é diferente e seu tratamento não é o mesmo que em adultos. . Os pesquisadores avaliaram os dados de 113 pacientes adultos com glioblastoma tratados entre 2011 e 2013. Os pacientes receberam dexametasona em dose alta. Uma parte dos pacientes recebeu dexametasona antes da cirurgia (pré-operatório), enquanto outra parte recebeu durante ou após a cirurgia (perioperatório ou pós-operatório).

Os pesquisadores verificaram que cerca de 60% dos pacientes apresentaram leucocitose relacionada ao tratamento com dexametasona, sem infecção ou outra causa identificável. Ao avaliar a sobrevida dos pacientes, eles descobriram que a leucocitose relacionada ao uso pré-operatório da dexametasona associou-se a uma redução pela metade da sobrevida dos pacientes. O mesmo não ocorreu quando avaliaram a influência da leucocitose peri- ou pós-operatória.

Para tentar entender o que aconteceu, os pesquisadores analisaram a histologia de alguns dos tumores de pacientes do estudo e descobriram que os tumores dos pacientes que tiveram leucocitose relacionada ao uso pré-operatório de dexametasona tinham menos granulócitos CD15+ e linfócitos CD3+ infiltrando seus tumores. Possivelmente, isso indica um prejuízo da resposta imune antitumoral local, porém os dados ainda são muito preliminares, os autores concluem.

Existem alguns raros trabalhos na literatura científica dando conta de algum risco aumentado de mortalidade quando a dexametasona é usada em pacientes com tumores cerebrais, mas até hoje esta droga é usada sem limitações para pacientes com os mais diversos tipos de doenças neoplásicas cerebrais. Uma das questões levantadas pelo trabalho é qual seria a possível alternativa de tratamento do edema cerebral relacionado aos tumores cerebrais, porém esta é uma questão que permanece em aberto.

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Em outro trabalho no mesmo número do JNO, pesquisadores do The Hospital for Sick Children em Toronto, no Canadá, avaliaram a função visual de 59 crianças tratadas para craniofaringioma. Este tumor benigno surge na região da glândula pituitária, logo posterior às vias ópticas, sendo muito comum que os pacientes apresentem baixa visual devido à doença.

Os pesquisadores relatam que a idade média dos pacientes avaliados era de 9,4 anos, e os sintomas mais frequentes ao diagnóstico foram cefaléia (76%), náuseas e vômitos (32%) e baixa visual (31%). Análise estatística mostrou que em 47% dos casos a baixa visual instalou-se nos primeiros 4 meses após o diagnóstico, sendo que o restante dos casos ocorreu esporadicamente ao longo de 8 anos de seguimento.

Pacientes mais jovens, com papiledema ao diagnóstico e aqueles que tiveram recidiva do tumor tiveram maior risco de baixa visual. Ao final do seguimento do estudo, 58% dos pacientes tinha baixa visual e 10% estavam legalmente cegos de pelo menos 1 olho. Os autores do estudo concluem que o seguimento da função visual destes pacientes é muito importante, especialmente naqueles com maior risco de sequelas visuais.

Figura: tomografia computadorizada mostrando edema cerebral (área escura) associada à um tumor cerebral. A dexametasona é largamente usada para tratar edema cerebral tumoral. Créditos Bobjgalindo GFDL ou CC BY-SA 4.0, da Wikimedia Commons.

Esta postagem não representa sugestão de tratamento. Apenas um especialista pode judiciosamente decidir quais informações divulgadas podem modificar de alguma forma um esquema de tratamento, e de que forma.

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